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Ponte virtual - 28/06/2018
A Disrupt e o pavilhão brasileiro: feira de ideias

O Vale do Silício, nos Estados Unidos, e a cena brasileira de startups — como são chamadas as empresas iniciantes com base na internet — estão se descobrindo. O Vale, sabemos, é a região ao sul de São Francisco, na Califórnia, onde nasceu a economia digital e se concentram muitas das empresas que a inventaram: Apple, Google, HP, Facebook e Intel são apenas algumas delas. Para os jovens brasileiros que sonham em se tornar o próximo Steve Jobs, descobrir o Vale significa beber na melhor fonte de investimentos, tecnologia e “jeito de fazer” uma startup dar certo. Os investidores e empreendedores do Vale, por sua vez, encontram no Brasil um mercado atraente e um manancial ainda inexplorado de talento tecnológico, empresarial e criativo.


Como se dá essa descoberta mútua? De várias maneiras. Investidores de lá buscam empresas promissoras aqui; empreendedores daqui vão para lá absorver a cultura de tecnologia e negócios locais, e muita gente cria instrumentos, como blogs, sites, feiras e viagens de exploração, que tentam juntar as pontas de um promissor intercâmbio. Dessa forma, a tecnologia da informação (TI) e a economia digital made in Brazil começam a ganhar espaço em eventos-vitrine que servem como atalho para a internacionalização das empresas iniciantes brasileiras.


Um desses eventos aconteceu em setembro deste ano, em São Francisco: o cenário foi a TechCrunch Disrupt, uma concorrida conferência sobre os negócios da tecnologia digital que atrai gente do mundo todo e estrelas como Mark Zuckerberg, o criador do Facebook. Este ano, a Disrupt deu um destaque especial às startups brasileiras, em reconhecimento à sua presença, cada vez maior, na cena global: pela primeira vez, elas foram reunidas em um espaço próprio, o Brazilian Pavilion, no qual cerca de 40 empresas iniciantes expuseram ideias e cases para investidores estrangeiros.  


No calor do TechCrunch Disrupt, mais um encontro, dentro do evento principal, jogou holofotes sobre as startups tupiniquins: o StartupiCon: Valley Meets Brazil, uma “noite de negócios” que reuniu empreendedores brasileiros e investidores do Vale. A noite foi promovida por Bob Wollheim, sócio de um site pioneiro dedicado ao tema, o Startupi (com acento tônico no “pi”). “Houve muito interesse, e alguns empreendedores tiveram reuniões com possíveis investidores”, diz Diego Remus, editor do Startupi. Em resumo: durante três dias, instalados num grande pavilhão, os jovens brasileiros tiveram a chance única de enfrentar o ritual mais esperado e temido da comunidade startup — o pitch, o momento, repetido muitas vezes, em que têm de vender seu peixe a investidores e parceiros — diante do público mais preparado e exigente, no lugar que é o umbigo da economia digital do planeta. E quanto mais sucintos e persuasivos forem, melhor.


Não podia haver ambiente melhor para gente como Rodrigo Griesi e Daniel Wunderlich, os criadores da plataforma Moovia.com, de Florianópolis (SC), que fizeram parte da expedição brasileira a São Francisco. A Moovia é uma rede social profissional que quer ir além da postagem de currículos. Segundo seus criadores, ela permite gerenciar projetos e trabalhar em comunidade do jeito que a geração startup gosta — sempre ligada à rede, em equipes, muitas vezes, a distância e tocando vários projetos ao mesmo tempo. A plataforma, de acordo com seus próprios números, tem 13 mil participantes, hospeda seis mil workspaces e já atraiu, além de brasileiros, americanos, chineses, filipinos e italianos.


Para Griesi, ir ao TechCrunch Disrupt foi como viajar no tempo e assistir ao nascimento das tecnologias que serão usadas em 2020. “Voltamos com vários contatos de clientes e investidores em potencial e, tão importante quanto, trouxemos conosco  ideias inovadoras que já podemos usar em nossos produtos a partir de agora”, diz ele. Outro participante do evento, o pernambucano radicado em Brasília Gustavo (Guga) Gorenstein, quer familiarizar o consumidor brasileiro com o conceito conhecido lá fora como cashback: ao fazer uma compra na internet por meio do site de sua startup, a Poup, o consumidor recebe de volta uma parcela do preço do produto ou serviço comprado — em torno de 3%, variando de um vendedor para outro. A Poup também ganha por encaminhar o consumidor à loja virtual (leia mais nestas páginas).     


Alguns empreendedores brasileiros já avançaram bastante no caminho que Griesi e Guga começam a trilhar. Gustavo Lemos, mineiro de 32 anos, é um exemplo: engenheiro de telecomunicações formado pela PUC-MG, fez pós-graduação em Finanças e Negócios na Stanford School of Business, na Califórnia. A empresa da qual ele é cofundador, a IDXP, desenvolveu uma tecnologia para monitorar o comportamento dos consumidores em tempo real no mundo físico — algo que só era viável fazer em lojas virtuais, nas quais se pode seguir e identificar cada clique do mouse. “Colocamos etiquetas inteligentes nos produtos e carrinhos de supermercados — como se fossem um GPS”, explica ele. “Faço no mundo real o que os varejistas já faziam na internet.” As etiquetas permitem rastrear os movimentos dos consumidores e dos produtos nas lojas, uma informação útil para que o lojista planeje sua oferta.


A ideia rendeu prêmios: a IDXP ficou em primeiro lugar no IBM SmartCamp Brazil 2011, um evento para startups promovido no Brasil pela gigante de serviços de informática. Daí para a frente, o planeta tem sido o limite: na disputa com as nove ganhadoras dos eventos regionais pelo mundo, no IBM SmartCamp Global Finals, em fevereiro deste ano, a startup brasileira levou o “campeonato mundial” no voto popular (no voto do júri, foi a segunda).


Reconhecimento desse calibre, mais do que apenas estímulo, acabou se revelando um desafio: “Recebemos ligações de clientes e investidores dos quatro cantos do planeta”, conta o emprendedor. “Foi como um tapa, do tipo: ‘acorda, moleque, pensa grande!’ ” Desafio aceito, Gustavo e equipe transplantaram uma filial da IDXP de Belo Horizonte para a Califórnia, onde ele e dois colegas da empresa já vivem há quatro meses, buscando aproveitar as oportunidades abertas pela premiação. “Aqui, no Vale, tomamos um choque de realidade”, constata. “Fica difícil operar no Brasil quando comparamos as facilidades daqui e de outros países desenvolvidos.” Facilidades que vão desde um ambiente legal e tributário muito mais favorável aos novos empreendedores até a presença de fundos e empresas vocacionados para fazer investimentos de risco. Participar de um ecossistema tão desenvolvido para nutrir empresas iniciantes foi a melhor coisa que poderia ter feito, afirmou o mineiro. “Espero poder levar um pouco dessa cultura de volta ao Brasil” (leia mais na pág. 56)


Na rota para a Califórnia, a empresa de Belo Horizonte pegou um atalho: recorreu ao apoio da Plug & Play Tech Center, uma investidora e aceleradora de startups. O que faz exatamente uma aceleradora? Ajuda empresas iniciantes promissoras por um tempo fixo — em geral, de três a seis meses — oferecendo escritórios temporários, aconselhamento (mentoring, no jargão do ramo), assistência legal e contábil e até pequenos investimentos, de maneira a deixá-las em condições de andar com suas próprias pernas ao fim do período de aceleração. A Plug & Play é americana, mas também lá havia um brasileiro no meio do caminho: Fernando Gouveia, o gerente de operações internacionais da aceleradora — justamente o responsável por identificar startups de países emergentes que tenham potencial para se beneficiar de uma internacionalização acelerada no Vale. Além da IDXP, outras startups brasileiras também passaram pelo crivo da Plug & Play. “No momento, trabalhamos com três empresas do Brasil: Dabee, Mowaiter e IDXP”, diz Fernando. O foco dos negócios é software e internet, além de “um pouquinho de hardware”.


Aos 25 anos, o jovem paulista encarna perfeitamente o perfil dos brasileiros que fazem a ponte entre o Vale do Silício e as comunidades de startups espalhadas por diversos países (o Brasil, inclusive). Além da pouca idade, são poliglotas — o inglês é a língua franca nos sites, conversas e eventos dessa turma — e se sentem à vontade em qualquer canto do planeta. Fernando já morou no México, na Grécia e em Taiwan, e se formou em Finanças e Negócios Internacionais pela Santa Clara University, na Califórnia. De seu privilegiado posto de observação, ele endossa a estratégia seguida por Gustavo Lemos para internacionalizar a IDXP: "As chances de uma startup brasileira conseguir investimentos estrangeiros aumentam muito quando ela está baseada nos EUA", diz.


Com ele está de acordo Flávio Pripas, sócio-fundador da Fashion.me, rede social de moda na qual as pessoas (leia-se mulheres) montam e comentam looks. Ela foi listada entre as 100 empresas mais inovadoras do mundo pela revista Fast Company. “O americano é o exemplo que todo empreendedor deve tomar como base”, afirma Pripas. “Ele tem grande mercado interno, mas pensa internacionalmente.” Flávio desviou-se da rota da Costa Oeste na hora de partir para o mundo — a Fashion.me abriu escritório em Nova York, a capital da moda nos EUA. Mas também se revela um entusiasta do Vale do Silício: é um dos organizadores do evento BRNewTech, uma plataforma de encontro entre empreendedores de alto impacto que pretende trazer a cultura de negócios do Vale para o Brasil.


Flávio já pode falar de uma lição assimilada, que chama de “regra número 1 para a internacionalização”: é preciso atentar para as especificidades de cada público, para as idiossincrasias de outros povos e culturas. “No meu negócio, que é moda e interatividade, percebemos que o público americano é muito mais reservado que o brasileiro”, constata. “A conversa não acontece assim tão facilmente.” A solução foi investir em parcerias e expertise locais, ele diz. O Fashion.me já contratou um funcionário americano e uma consultoria de moda especializada no segmento fashion de NY.


No mundo da economia digital, a busca por sacadas comportamentais e tecnológicas que rendam bons negócios é uma obsessão. A IBM promove seus SmartCamps para revelar startups promissoras? Pois a fabricante de chips Intel põe dinheiro nelas por meio de seu braço de investimentos de risco, a Intel Capital. De novo, uma brasileira iniciante cavou um lugar nessa foto: a PagPop, de Ribeirão Preto, em São Paulo (com um centro de tecnologia instalado no Rio). Em outubro, durante seu Global Summit, encontro que reuniu centenas de empreendedores de todo o mundo na Califórnia, a Intel Capital anunciou investimentos de 40 milhões de dólares em dez startups — uma delas é a PagPop, juntamente com outras quatro nos EUA, duas na China, e uma cada na Índia, Coreia do Sul e em Taiwan. A empresa paulista desenvolveu um sistema de pagamentos para profissionais liberais que permite aceitar cartões de crédito por meio de telefones fixos, celulares, smartphones e tablets.


“O mercado para expandir este tipo de serviço transcende o Brasil”, acredita Márcio Campos, o executivo-chefe da startup. O valor exato do aporte da Intel Capital não foi revelado, mas a empresa brasileira foi enquadrada na categoria A, que vai de 2 a 10 milhões de dólares. A história da PagPop ilustra outra das formas que pode tomar a descoberta mútua sobre a qual escrevemos no começo: em vez de empreendedores brasileiros indo para lá, são investidores do Vale do Silício trazendo recursos para cá. Esse foi o sexto investimento da Intel Capital no Brasil em 2012 (a Fashion.me, citada acima, recebeu um desses aportes). Do lado da PagPop, representou a segunda injeção de capital recebida pela startup e a primeira de investidores estrangeiros. “Foi um grande facilitador”, diz Campos.


Agora com um escritório também em São Paulo, a empresa se prepara para receber um terceiro aporte ainda este ano. “Em 2013, teremos o Brasil como foco principal, mas já planejamos expandir operações para a América Latina”, adianta Campos, festejando o novo investidor (que não identifica). “É um caps lock!”, diz apenas — a gíria dos fanáticos por computadores para um peixe grande.


Empresários na situação de Márcio terão, no ano que vem, a possibilidade de levantar capital aqui mesmo, por meio do programa Startup Brasil, lançado em novembro pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O programa é parte do Plano TI Maior do governo federal, de estímulo às empresas de base tecnológica. O objetivo é investir 40 milhões de reais em startups até 2015 — cada uma das empresas, que serão selecionadas entre janeiro e março de 2013, receberá 200 mil reais. O programa oficial, assim como tantas iniciativas privadas, vai cultivar os laços cada vez mais estreitos entre a comunidade brasileira de startups e o Vale do Silício: está prevista a instalação de um braço do Startup Brasil na Califórnia, coordenado pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), informa Rafael Henrique Rodrigues Moreira, coordenador-geral de software e serviços de TI do MCTI. A meta é abrir portas para vendas no exterior e para a captação de investimentos. “Somos um país de empreendedores, num evento de empreendedorismo numa capital do norte, tivemos 3,2 mil inscrições”, afirma Moreira. “Os jovens querem ter seus próprios negócios de TI, e os investidores estrangeiros enxergam o Brasil com esse grande potencial.”


Que chegou a hora dessa gente bronzeada (ou nem tanto!) mostrar seu valor, não há quem negue. Mas não basta o hype — o barulho na mídia em torno da nova fronteira da economia digital —, avisa Bob Wollheim, o sócio do Startupi. “Existe oportunidade no Brasil, mas o país não é um ‘Velho Oeste’ a ser desbravado”, diz ele. “Grande parte da energia empreendedora precisa do hype, pois ajuda a chamar a atenção e dá coragem para fazer, mas percebemos que é preciso informação mais consistente para nortear os investidores estrangeiros no Brasil.”


Em outras palavras: num país complexo, com tantas idiossincrasias burocráticas, esses investidores precisam entender as vantagens e também as dificuldades de se fazer negócios aqui. “Mostrar um cenário pé no chão, com discussões e participantes mais maduros, compartilhando experiências de sucesso e fracasso”, é a receita de Bob — uma tarefa que pode começar na busca de parceiros locais para os estrangeiros, “para que eles próprios se tornem mais ‘brasileiros’ ”. Danilo Amaral, da Trindade Investimentos, sócio de Bob e patrocinador do encontro StartupiCon: Valley Meets Brazil, criou uma imagem para esse inevitável estágio de aclimatação aos trópicos: “Antes de fazer negócios no Brasil, tem de aprender a comer frango à passarinho com a mão!”


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